Surfistas mães e mães de atletas relatam a experiência da maternidade

Nicole Pacelli (Arquivo Pessoal)Nicole Pacelli (Arquivo Pessoal)

Além da paixão pelo mar, as surfistas Marina Werneck, Claudinha Gonçalves e Nicole Pacelli, têm em comum o fato de terem se tornado mães em fevereiro de 2020 e passaram o primeiro Dia das Mães em total sintonia com seus bebês. Temporariamente, trocaram pranchas, parafinas e ondas por fraldas, amamentação e algumas noites mal dormidas. Marina está encantada com Moana, Claudinha é mãe totalmente entregue à Clara e Nicole diz que faz todo o sentido ser mãe de Rudá. O amor é total, mas as atletas não escondem também a vontade de voltar a surfar. Pensando nessas mamães de primeira viagem e também nas mães de três dos melhores surfistas do ranking mundial da atualidade, Ítalo Ferreira (1º), Gabriel Medina (2º), Filipe Toledo (4º) e de ondas gigantes, Lucas Chianca “Chumbo”, a World Surf League (WSL) resolveu homenageá-las com esses relatos.

Embaixadora do surfe feminino pela WSL Latin America, a carioca radicada em Florianópolis (SC), Marina Werneck, já cruzou o mundo atrás das melhores ondas e conquistou vários títulos. Começou a competir aos 12 anos, há oito é adepta ao free surf e chega aos 32 realizada como mãe e se adaptando à nova rotina. “Nestes quase três meses de maternidade o aprendizado é gigante, um momento de total entrega e conexão com minha filha. É mágico, mas de grande responsabilidade”, afirma.

No último domingo, 10, Marina teve um Dia das Mães mais que especial: “É a primeira vez as quatro gerações juntas, minha mãe e avó estão em casa”. A presença da mãe também foi crucial para a atleta quebrar um jejum de três meses sem praticar o esporte, pois surfou até os oito meses de gestação. “Com o suporte da minha mãe peguei duas ondinhas na semana passada (em Santa Catarina, o surfe está liberado) e foi o melhor mar da minha vida e a melhor sensação. É um privilégio morar em frente ao mar e não vejo a hora de levar Moana para surfar comigo”, ressalta Marina.

Marina Werneck (Arquivo Pessoal)

Marina Werneck (Arquivo Pessoal)

“Minha vida mudou completamente e para melhor! Meu filho faz eu querer dar o melhor de mim todos os dias e viver o presente. Comecei a dar valor a coisas mais simples e básicas do dia a dia, a maternidade me trouxe isso”, comemora Nicole Pacelli, 28 anos, surfista de ondas gigantes, Campeã Mundial ISA (International Surf Association) e Campeã Mundial de Stand Up. Apesar da dedicação integral a Rudá, quando o bebê completou um mês, ela conta que conseguiu surfar para matar a saudade do mar.

“O deixei com o pai e surfei por 30 minutos e foi ótimo, mas depois disso nunca mais, pois veio a pandemia. Quando tudo isso acabar pretendo voltar a surfar normalmente”, afirma Nicole, nascida em Maresias (São Sebastião/SP). Ela considera uma das vantagens de ser profissional no SUP (Stand Up Paddle) o fato de não precisar encostar a barriga na prancha, por esse motivo surfou até 38 semanas de gestação.

Paulista do Guarujá (SP), mas residindo na capital carioca, Claudinha Gonçalves, 35 anos, destaca ser este o momento mais desafiador e incrível de sua existência: “Me sinto a mulher mais completa e forte do mundo. A maternidade é intensa, exaustiva e transformadora. É uma sensação de pertencimento e cumplicidade que jamais imaginei sentir”. Atleta e produtora de conteúdo e de elenco do Canal Off, Claudinha também surfou até os oito meses de gestação e não vê a hora cair no mar.

“Surfar grávida foi umas das experiências mais emocionantes que vivi, um privilégio! Quando tudo isso passar pretendo revezar ondas e mamadas, porque o pediatra já liberou levar a Clarinha para a praia”, finaliza a surfista, que há um ano, está à frente de um projeto de clínicas de surfe feminino para encorajar e capacitar mulheres a praticar o esporte.

Campeões mundiais sob o olhar atento das mães – Se há alguém que vibra e sofre junto aos campeões mundiais da WSL são as suas mães. A maioria acompanha de longe os circuitos, mas com a ajuda da tecnologia fica mais fácil. Outras, porém, têm o privilégio de estarem presentes em finais do CT (Circuito Mundial). O que não faltam são orações, preces e tudo o que a fé permitir para a proteção dos filhos num esporte em que, além de técnica e habilidade, é necessária muita coragem para desbravar o mar.

Com trajetórias de vidas distintas, essas matriarcas têm em comum muita luta, dedicação e sacrifícios para viabilizar viagens e participações em campeonatos Brasil afora, muito antes de os filhos se tornarem surfistas profissionais com projeção internacional. Os depoimentos de Katiana Batista, Simone Medina, Mari Toledo e Michele Cabral, retratam esse amor incondicional de que as mães tanto falam, sobretudo ao ver o sonho de um filho realizado.

Claudia Gonçalves (Arquivo Pessoal)

Claudia Gonçalves (Arquivo Pessoal)

Katiana Batista, de Baia Formosa/RN (mãe de Ítalo Ferreira – Campeão Mundial de 2019): “Sinto muito orgulho do Ítalo, que trabalhou pesado para chegar onde está e nem consigo descrever em palavras esse título conquistado por ele. É ainda um sonho que estamos vivenciando e um momento que vamos levar para a vida toda. Se Deus quiser é somente o início de muitas vitórias! Independentemente de já estar acostumada a assistir as competições dele, como mãe ainda tenho receio em vê-lo pegando grandes ondas. Mesmo que ele treine e se dedique muito e surfe bem, o frio na minha barriga sempre vem, pois o surfe não depende exclusivamente do surfista, mas muito das condições da natureza. Ítalo é o mais velho, com 26 anos, e depois vem a Pollyana, de 23, que gosta de surfar também, mas apenas por diversão porque competição nunca foi seu foco”.

Simone Medina, de Maresias/São Sebastião-SP (mãe de Gabriel Medina – Bicampeão Mundial 2014 e 2018): “No começo não foi fácil, o primeiro ano do Gabriel no CT (2011), em Pipeline, fiquei sem dormir, pedia a Deus para o mar baixar e baixou tanto que ficaram adiando as provas. Até que Gabriel pediu para que eu parasse com aquilo, senão não haveria campeonato. E, a partir daí, entendi que o que o deixava feliz era o mar grande e onda grande. Ver um filho realizando um sonho é demais, porque o sonho dele passa a ser o seu, é uma vida inteira projetando o futuro dos nossos filhos. Quando vi Gabriel sendo pela primeira vez campeão do mundo foi mágico, como se ele tivesse nascido de novo. Cada título foi de um jeito, com emoções diferentes, um momento único. Já estou me preparando para quando esse tri chegar. Com a Sofia (outra de seus filhos, de 14 anos, também surfista) vivencio um outro círculo da vida, pois minha insegurança não é tão grande hoje. Lógico que me preocupo em lugares com risco de tubarão, por exemplo, mas evito passar esse tipo de medo para eles. Fico feliz em vê-los correndo para o mar, pois a felicidade deles é mais importante do que qualquer circunstância”.

Mari Toledo, de San Clemente/Califórnia – EUA (mãe de Filipe Toledo – 4º do ranking mundial e tricampeão da etapa brasileira do CT): “Morro de medo do mar e a vida inteira precisei lidar com isso vendo o Ricardinho (marido e ex-surfista) colocando as crianças na água desde cedo. Mas sempre confiei muito em Deus e meus filhos sabem os seus limites. Tenho quatro filhos (Matheus de 29 anos, Filipe de 25, Davi de 21 e Sofia de 19) e todos surfam, mas atualmente apenas Filipe compete profissionalmente. A sensação de medo aumenta quando vejo Filipe numa onda com fundo de corais ou em ondas muito fortes, pois, dependendo como cai, me preocupo. Coração de mãe é assim mesmo e ele faz muito bem o seu papel. Ainda vou sentir a emoção de ver meu filho sendo campeão mundial. Quanto ao DNA da família, acredito que meus netos (Mahina e Koa –filhos de Filipinho) vão seguir o mesmo caminho do pai e do avô, principalmente o Koa, que é super atirado e vai ser um grande surfista também”.

Michele Cabral, de Saquarema/RJ (mãe de Lucas Chumbo – Campeão do Nazaré Tow Surfing Challenge 2020, categoria duplas): “Esse mundo dos esportes radicais exige muito do emocional e sempre fez parte de nossas vidas. Somos uma família de surfistas e além do Lucas (24 anos) tenho o João Vitor (Chumbinho de 19). Acostumei com o mar gigante, mas a tensão é eterna. Até hoje não consigo ver um campeonato do Lucas ao vivo. Quando entra no mar, fico nervosa e, ao mesmo tempo, feliz. E rezo muito. Graças à tecnologia, consigo administrar melhor as emoções. É um trabalho de profunda dedicação e comprometimento, pois o surfe exige isso. Lucas viveu meses muito intensos desde o ano passado: foi treinar em Portugal, depois competiu no Havaí, onde se lesionou, depois foi para Espanha, passou as festas no Brasil e, ainda participou do BBB20. Depois de eliminado do programa, foi a Portugal e tornou-se campeão (ondas gigantes) WSL em Nazaré. É uma explosão de sentimentos: gratidão, reconhecimento e felicidade por sua conquista”.

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